Ensino remoto traz nova onda de aplicativos educacionais ‘tudo em um’

Conhecidos como superaplicativos, eles reúnem recursos para aprendizagem, gestão escolar e relacionamento com fornecedores. Mas como a lei de proteção de dados enxerga isso?

Um login para acessar as notas e o boletim, outro para acessar a plataforma de videoaulas, um terceiro para acompanhar a agenda. E assim por diante. Em tempos de ensino remoto e uso intenso da tecnologia no contexto educacional, é cada vez mais comum que pais, alunos, educadores e instituições de ensino tenham variadas plataformas para gerir suas vidas escolares.

Mas um movimento que tem ganhado força nos últimos anos quer que isso seja diferente. Conhecidos como “Super Apps”, os superaplicativos são plataformas que buscam unificar em um único lugar todos os logins e senhas de usuários. Fora da área da educação, existem diversos exemplos ativos e operantes, como os aplicativos onde podemos comprar, pedir para entregar e/ou retirar o almoço, objetos, documentos, realizar pagamentos, etc.

Nas escolas, diminuir a quantidade de cliques entre ferramentas de comunicação, gestão e aprendizagem é valioso para todos os envolvidos, sejam  professores, gestores, pais e alunos. “A integração de tecnologia e a criação delas são fundamentais para garantir a eficiência do processo de transformação digital da escola”, aponta Thiago Chaer, CEO da Future Education. Chaer é um entusiasta do ramo e menciona que, dentre as principais vantagens desses superaplicativos está justamente a possibilidade de ter tudo à mão, em um único ambiente.

Soluções como essa são desenvolvidas no formato de Sistemas de Gestão de Aprendizagem (LMS, Learning Management System, na sigla em inglês), que se inserem dentro do ambiente virtual de aprendizagem e são um tipo de suporte à educação. Aqui no Porvir, já falamos desse tipo de solução tecnológica em duas ocasiões (aqui e aqui), mas por que agora é diferente?

No contexto da pandemia, como em nenhum outro momento, muitas escolas se viram obrigadas a adotar o uso das tecnologias digitais em suas rotinas, seja por meio de videoaulas ou para outras questões administrativas. Augusto Portugal, diretor técnico da Foreducation EdTech, que é desenvolvedora da Orchestra4edu, plataforma que unifica serviços da Google e automatiza diferentes processos do Workspace, aponta que ter de usar a tecnologia para tudo deixou evidente para a maioria das pessoas pontos onde esse tipo de recurso pode contribuir mesmo quando é uma opção, e não uma obrigação.

A plataforma desenvolvida pela edtech foi utilizada em 2020 como método de integração de serviços Google nas secretarias municipais de educação de São Paulo e do Rio de Janeiro.

Portugal destaca que ter uma dessas plataformas pode viabilizar o funcionamento e gestão mais eficiente de toda a rede, principalmente de redes maiores, como é o caso de São Paulo. De acordo com Censo Escolar de 2018, feito pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a capital paulista possuía mais de um milhão de alunos matriculados somente no ensino fundamental.

A junção de diferentes serviços em um só vem para facilitar. “Há uma preocupação com o engajamento, com absorção de conteúdo e com dar ao professor  ferramentas que de fato o auxiliem no processo de dar aula”, destaca Fernando Turolla, diretor de desenvolvimento de sistemas na Foreducation. Ele ressalta, porém, que esse excesso de serviços não pode dificultar mais do que ajudar os professores. “É pensar em engajamento e simplicidade, não criar um monte de floreio e opção, mas se preocupar com o processo pedagógico”, afirma.

“Na verdade, os professores geralmente precisam de coisas simples. É preciso ficar atento para não criar complicadores desnecessários na vida do professor”, diz Augusto Portugal.

Para Thiago Chaer, principalmente para pais de alunos de redes de ensino privadas, que precisam acompanhar quadros financeiros e pagamentos, além dos boletins, é um grande avanço contar com algo assim. Mas quando se trata do ensino público, as vantagens não se concentram na questão financeira, mas sim na possibilidade de que pais e mães acompanhem a vida escolar de seus filhos e que, associados a outros serviços públicos, o “Super App” esteja conectado com outras áreas, como saúde e empregabilidade, por exemplo.

Dados protegidos Ter uma plataforma que reúne diferentes logins envolve um outro complicador que deve ser observado tanto pelas instituições de ensino que contratam o serviço, quanto por pais e professores que o utilizam. Trata-se do elevado número de dados pessoais que a plataforma pode exigir e conter dentro dela. Há a possibilidade de que, além de servir como centralizadoras de login, plataformas como essas possam ser aglutinadoras de dados de diferentes origens.

Cecilia Choeri, especialista em proteção digital e compliance (área que se dedica a analisar relações éticas em negócios e instituições), sócia do escritório Chediak Advogados, destaca que qualquer tratamento de dados (coleta, classificação, utilização, armazenamento, eliminação, avaliação, dentre outros) deve ser constantemente revisto, principalmente quando se trata de crianças e adolescentes. É preciso tornar clara a finalidade do uso desses dados, sejam eles coletados para criar o perfil do aluno, por exemplo, sejam para fornecer informações sobre os boletins.

A advogada destaca que independentemente de os dados terem vindo de empresas diferentes, as plataformas centralizadoras são também controladoras dos dados e, portanto, responsáveis por eles. “Eu acho que temos que ter uma preocupação com os dados, mas é preciso ter um balanço. O mais importante é a pessoa decidir o que faz com o que é dela. Acho que esses superaplicativos vieram para ficar, são uma facilidade, a gente tem vários inclusive fora da área de educação, que são úteis e as pessoas gostam, então o ideal é discutir algo relacionado à regulação”. Essa regulação a qual ela se refere seria com base na LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), de 2018.

Ivan Seidel, presidente-executivo da Layers Education, que se auto intitula como “O Super App da Educação”, concorda que é necessário deixar claro para o contratante do serviço quais dados a plataforma terá acesso e solicitar o consentimento dos usuários em relação a esse uso de dados. Um dos principais argumentos destacados pelo executivo é o fato de que alguns dados precisam ser acessados por se tratarem de algo do interesse de quem deseja ter o serviço, por exemplo.

“É muito comum empresas grandes olharem para a tecnologia só tentando tapar buracos e o que acontece quando se tenta só resolver problemas e não olha para o cenário inteiro é que acabam sendo criadas apenas soluções específicas.” No ano passado, a edtech transacionou cerca de R$50 milhões nas variadas aplicações da Layers, que vão desde serviços para instituições de ensino até operações de comércio eletrônico com outras edtechs.

O futuro parece ter um lugar para esses aplicativos agregadores. Seidel destaca que o mundo passa hoje por um processo de transformação que não começou na pandemia, mas que foi acelerado por ela. “Eu enxergo que estamos passando por um processo de entender o que cada ferramenta faz para então saber como utilizá-la cada vez melhor. Talvez não para todas as escolas no presente, que ainda estão num mundo inicial da tecnologia. E queremos ser uma ferramenta, não uma plataforma de educação”, afirmou.

Saiba mais em: https://porvir.org/ensino-remoto-traz-nova-onda-de-aplicativos-educacionais-tudo-em-um/

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